acma1953

 
Rejestracja: 2011-01-03
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Ficção ou realidade

Nas minhas deambulações pelas leituras, encontrei este texto "ficcional" que bem se pode considerar e adaptar à realidade. Achei este texto muito interessante que nos transmite no final uma bela mensagem. Como sou um romântico também acho que o amor consegue superar todas as barreiras.

Madame Antonietta Vasconcellos e Dom Leonardo del Pozo Real
Esta é a história de Madame Antonietta de Vasconcellos e de seu gato D. Leonardo del Pozo Real. Madame pertencia à mais fina e apurada aristocracia europeia, correndo-lhe nas veias o invejável sangue dos mais refinados cruzamentos de famílias reais. D. Leonardo del Pozo, o gato, pertencia à família real espanhola e nas suas veias corria o sangue de centenas de gatos persas, pertencentes à casa real espanhola. À falta de descendentes humanos directos do rei, D. Leonardo concorria de igual para igual na corrida ao trono com qualquer primo em quinto grau do rei de Espanha. 

Madame Antonietta e D. Leonardo viviam no Estoril, num palacete dos finais do séc. XVIII, com traça colonial, muito bem conservado e situado em frente à praia. Madame era uma velha cheia de tiques, achaques e achiques, alérgica ao pó, sofria de tremores com a luz do Sol, alérgica a quase todas as flores e aromas e só comia carne de vaca importada da Polónia. Dizia que o seu tetra-avô durou até aos 130 anos não só pelo sangue real, mas também por comer apenas carne de vaca do seu país. Não valia a pena dizer-lhe nada em contrário, pois Madame não admitia opiniões contrárias às suas, achando-as de um péssimo gosto, dignas do pessoal menor. Convém, entretanto, referir o pormenor que pessoal menor somos todos nós, ao não nos correr nas veias o sangue de trinta e sete gerações de reis europeus. D. Leonardo, por seu turno, alimentava-se de ovas de estrujão importadas pela própria Madame (sem intermediários) da Ucrânia. 

Madame tinha uma educação espartana e muito católica, pelo que não admitia atrasos a ninguém, nem mesmo a D. Leonardo, a quem exigia pontualidade sobretudo às refeições. 

As refeições eram a hora mais importante do dia. Eram tomadas na sala de jantar, numa mesa de vinte lugares. Madame e D. Leonardo sentavam-se cada um em sua ponta da mesa, como exige a etiqueta. D. Leonardo sentava-se na cadeira e uma das duas criadas, que o serviam vinte e quatro horas por dia, dava-lhe cuidadosamente as ovas de esturjão à boca, limpando-lhe os bigodes entre cada garfada. 

Era um gato extremamente gordo e calmo, sempre cansado da vida e das mesquinhices do pessoal menor. No entanto, era um gato! E, como tal, as dezenas de gerações reais que lhe formavam a cadeia genética não conseguiram eliminar a tara por pássaros. Era a única tara que a Madame admitia a D. Leonardo, dando-se inclusive ao trabalho de estimulá-la ao ponto de ter a casa ocupada por centenas de canários que cantavam o dia todo para deleite do Dom. 

Para que Sua Excelência não se enfastiasse, Madame Antonietta contratou um violinista, cuja tarefa era unicamente tocar violino doze horas por dia. Tocava para deleite do Dom e para avivar e refinar o canto dos canários, que o acompanhavam em coro. Quando o Dom dormia, o violinista estava autorizado a fumar um cigarro na área de serviço do palacete. 

A Madame tinha horror aos passeios do Dom pelo jardim. Um gato real, puro sangue persa, era demasiado perfeito para se passear pelos jardins do palacete à mercê de qualquer rafeiro ...ou rafeira que por ali passasse. No entanto, Dom Leonardo baldava-se sempre que podia e marcava território pelos vários cantos do jardim, destruindo antúrios, girassois, tulipas, malmequeres e outras flores que Madame tão bem tratava e amava. 

Certo dia, Dom Leonardo foi até ao jardim e nunca mais voltou. Madame pediu ajuda à polícia, aos bombeiros. Contratou inclusive um detective particular. 

Depois de muito procurar e de seguir muitas pistas, o detective localizou o Dom, sujo, magro, aleijado numa praia ali perto e acompanhado por uma gata preta. Conseguiu fotografá-lo mas não havia caviar que convencesse Dom Leonardo a voltar ao fastio da velha casa. Trocara a vida de rei pelo amor de uma gata preta rafeira e passeava como um vagabundo pelas praias da linha. 

Conta-se que Madame se fechou em casa e que morreu de tanto chorar e que ainda hoje, passados cinquenta anos, se houve o fantasma dela tocando violino no velho palacete, olhando o mar... 

https://www.youtube.com/watch?v=ZdqCfMQUXTY